sábado, 24 de março de 2012

Poema 15

Viagens


                            Quem faria
                            num entreato de obscuridade
                            dormir o meu coração gelado?
                           
                            Que, entre luzes e estrelas
                            faria queimar de gritos a voz
calada do meu peito vazio?

E quem, sonhando com um lírio
solto no céu acreditaria se visse
crepitar no espaço meu pensamento?

Durmo nervoso
num soluço de sol, poeira e bruma
aflito com os passos tardios do amanhecer.


Lorena

* Poema escrito em homenagem à minha filha, quando ela estava com 9 anos de idade, hoje com 26.
 


Assim como o tempo
que vai no vento
seu jeito de flor no cabelo
acende minha voz de cantor

Hoje eu acordei azul
ouvi você sorrir ao longe
me fez buscar a brisa do mar
vendo minha menina brilhar em meus olhos
como um arco-íris que atravessa o ar


Deu um sorriso na esquina
sandalhinha de couro
saiu pedalando a bicicleta
gingando feito borboleta, pensei:
você vai morar para sempre no meu casulo

A princesa é a minha cara
e tem um coração do tamanho do mundo
seus olhinhos diamantes raros
essa menina de quem tanto falo
é minha filha, meu amor puro.


Publicado em 24.03.2012 - data do 26º aniversário da Lorena

terça-feira, 20 de março de 2012

80 Primaveras parte IV - os filhos

Aqui a Dona Ruth irá ter revelada a história de seus oito filhos.


     6 de abril de 1955. Nasce em Araguari, no Hospital da Estrada de Ferro Goyaz, seu primeiro rebento: José Alberto, forte, bonito, moreno, ‘a cara do pai’, que depois ia servir de fôrma pra outros filhos, puxando a ‘cara e o focinho dos Ribeiro’. Mas o menino Zeca chorava dia e noite - até que alguém diagnosticou: a Ruth tem muito leite, mas o leite ‘tá fraco’, não sustenta o menino, por isso o choro madrugada adentro’.


     18 de julho de 1956, nasceu a menina Régia Ribeiro, branquinha e linda, que depois viria a ser uma loirinha muito boazinha, obediente e amorosa, uma pessoa iluminada e cheia de ternura, daqueles tempos até os dias de hoje.

     11 de julho de 1956, foi a vez de nascer o filho que herdaria o nome do pai: Eli Ribeiro Júnior, bebê forte, menino alegre, rapaz inteligente e tinhoso, ‘namoradô’ e caprichoso, bom filho, bom amigo, irmão, marido, pai e avô amoroso como ele só.
       24 de abril de 1958, chega o filhote Marcus Vinícius Ribeiro, bebê moreninho, bom menino, rapaz inteligente e trabalhador, hoje um super pai, super filho, maridão, super avô.

     1° de outubro de 1959. Às vésperas da inauguração da nova capital federal, vem ao mundo o quinto filho: Ricardo Wagner, bebê branquinho como a irmã Régia, quietinho, criado em caixote, foi muito esperto em dizer “não conto”, pra não confessar que comeu as bananas que seriam para a vitamina que Dona Ruth ia fazer pra toda a manada de filhos tomar e continuar a crescer viçosos.

     E assim, sucessivamente, foram nascendo outros filhotes: 24 de novembro de 1960, nasce Leonardo Alexandre, menininho raquítico que teve ‘bronquite’ e que exigiu muitos cuidados da mãe.

     Em 8 de novembro de 1961 chega o filhão Dalton Mendhelson, outro rebento que nasceu forte como um touro e que até hoje é um forte, atlético e bonito rapaz. Até aí, todos nascidos no Hospital Ferroviário, da Goyaz.
     Finalmente, aos 17 de janeiro de 1963, vinga a caçulinha Rejane, que nasceu em casa, a mãe sozinha, teve que pedir socorro para alguém ir chamar uma parteira, pra ajudar a menininha a nascer, só chegando depois que ela já estava do lado de fora.

     E assim foi, Dona Ruth, que você foi vivendo e trazendo ao mundo essas oito vidas, fora um ou dois que não vingaram, Deus sabe o por quê e Ele tem sempre razão, Ele que tudo sabe e tudo pode.

80 PRIMAVERAS parte III

E a história da minha mãe, Ruth, hoje aos 80 anos, continua.

Convite da festinha em homenagem aos 80 anos da Ruth

     Bonita como uma rosa em flor, você foi cobiçada por muito rapaz, chegou a ter uns namoricos, teve até dois moços muito apaixonados – Moraes e Vasco, que te pediram em casamento, mas ‘Seu Alberto e Dona Nedina’ num queriam não: “– por medo de fazer nossa ‘fia’ sofrê,”, dizia ele. O ciúme andava a cavalo e ninguém servia pra casar com as meninas do Seu Alberto.

     1953. Tempo vai, tempo vem, você já era mulher feita no corpo e na mente, freqüente na escola dominical, já tinha algum tempo de namoro com o jovem Eli, filho do Sr. José Ribeiro, ferroviário da Goiás, e de Dona Estelina, resolvem se casar na Igreja Presbiteriana. A partir daí, nossa história estaria só começando.

     Uns tempos morando na casa dos sogros, finalmente foram morar de aluguel em casinha simples, quase sem mobília, sem água encanada, fogão que você improvisava com algumas pedras e uma trempe no chão, você cozinhava o parco almoço, imagina-se que um arroz, feijão e talvez chuchu ou abóbora, raramente um pedaço de carne. Assim o tempo foi passando, mas Deus sempre ali dando providência.

80 PRIMAVERAS II

A história de vida da Ruth, minha mãe, vai sendo aos poucos revelada aqui nessas postagens. Vamos à parte dois.

Casarão colonial na Araguari daqueles tempos (Foto: Arquivo)
     Feito ciganos, mudando de cidadezinha em cidadezinha: Monte Carmelo, Douradoquara, Abadia dos Dourados, Araguari, Três Ranchos, novamente Araguari. O tempo foi passando e você cresceu, foi ficando menina-moça e conseguiu estudar um ano do primário, onde aprendeu a ler e a escrever, conhecimento esse que ia fazer de você uma pessoa sabida, de pouco estudo, é verdade, mas de boa memória, boa leitura e uma letrinha bem bonitinha. Com a cabeça cheia de poesia, já capaz de ‘rancar suspiro’ em muito rapaz e nas amigas que ficavam escutando você declamar na fábrica de bala, onde você labutou, junto com a irmã Rizete, com a futura cunhada Ilva e com as amigas – Zinha, Gizete, Maria Conceição – colegas de forno, corte e embrulho de balinhas que iam ser vendidas ‘na venda’ e nos bares da vida.

     Foi nos vaivéns daqueles tempos duros que você se transformou, enfim, numa linda moça, querida pelos tios e tias, a ponto de vir morar em Uberlândia com o Tio Hélvio e tia Dondica, pra ajudar na lida da casa e sair um pouco da barra das calças do ‘Seu Alberto e das saias da Dona Nedina’, que tinham um ciúme danado, a ponto de vigiar as filhas até detrás da moita, pra ‘num podê namorá ninhum rapaiz’ até chegar um moço bão que pudesse casar e honrar a família – família pobre, mas honrada. Tempos difíceis aqueles, em moça?

80 PRIMAVERAS I

Dona Ruth, minha mãe, mineira de Monte Carmelo, completou 80 anos de vida dia 1° de março último. Na qualidade de filho (quinto da lista de oito) e apaixonado por ela, escrevi uma historinha bem bonitinha de tudo o que ouvi e recortei na memória ao longo desses meus 52, dela mesma, de meus avós e outras pessoas muito ligadas à mãezinha. Resolvi, então, publicá-la aqui no blog Geraes, dividida em partes. Aí vai a primeira delas.

D. Ruth e este blogueiro (foto: Ricardo W. Ribeiro)

          Psiuu! Ei, menina! É! É com você mesma que eu estou falando! Lembra daquele tempo que você brincava, enquanto ajudava a ‘Dona Enedina’ a cuidar da casa e das irmãs menores? Sim! Você corria - 'pèzinhos’ descalços, ‘vistidinho' de paninho velho desbotado, balançava na 'gangorra', depois voltava e ajudava a peneirar o feijão, varria a casa de chão batido com vassoura de palha, ‘ariava’ as panelas de ferro, tirava água da cisterna, punha no fogo pra ‘quentá’, ajudava a ferver a roupa, colocava pra qüarar no sol.

          Enquanto isso, a ‘Dona Nedina’ tava lá, dentro do ‘córgo’, com a água batendo na cintura, esfregando a roupa que lavava com sabão de bola... e gritava de lá: ê minina, vai correndo buscar a lenha com seu irmão e volta logo, que ainda tem muita coisa pra fazer aqui. E vocês voltavam, trazendo aqueles fechos de lenha amarrados e gravetos, que se equilibravam na cabeça. Lembra?

          Algum tempo depois, minina, você tinha lá seus nove anos de idade, talvez um pouco menos, e ia pra roça com o ‘Seu Alberto’, na garupa do cavalo ‘modi cuzinhá pra ele’ e pros piões, onde o carpinteiro trabalhava, fazendo curral, paiol, portêra, madeiramento de telhado, assentando portas e janelas naquelas casas antigas de fazenda pelo Goiás e Minas Gerais afora.