Escreve o poeta: “Quando me acontecer alguma pecúnia, passante de um milhão de cruzeiros, compro uma ilha; não muito longe do litoral, que o litoral faz falta; nem tão perto, também, que de lá possa eu aspirar a fumaça e a graxa do porto.
Continua o poeta: “ ... mas será que se procura realmente nas ilhas a ocasião de ser feliz, ou um modo de sê-lo? E só se alcançaria tal mercê, de índole extremamente subjetiva, no regaço de uma ilha, e não igualmente em terra comum?... Procuro uma ilha, como já procurei uma noiva... A ilha dever ser o quantum satis (na medida exata) selvagem, sem bichos superiores à força e ao medo do homem... Para esta ilha sóbria não se levará bíblia nem se carregarão discos... Nossa vida interior tende à inércia. E bem-vinda é a provocação que lhe avive a sensibilidade, impelindo-a aos devaneios que formam a crônica particular do homem, passada muitas vezes dentro dele, somente, mas compensando em variedade ou em profundeza o medíocre da vida social... Não levem para as ilhas os problemas de hegemonia e ciúme... A ilha é meditação despojada, renúncia ao desejo de influir e atrair... Em geral, não se pedem companheiros, mas cúmplices. E este é o risco da convivência ideológica. Por outro lado, há certo gosto em pensar sozinho. É ato individual, como nascer e morrer. A ilha é, afinal de contas, o refúgio último da liberdade, que em toda a parte se busca destruir. Amemos a ilha.”
Segundo Carlos Vieira, "A prosa de Drummond é séria, profunda, psicologicamente acertada, e mais ainda: uma verdadeira lição para se viver, conviver, guardando com o parceiro ou com qualquer coisa que se tenha na vida, uma relação de juntos e separados, caso contrário não sobreviveremos às crises de “angústia de intrusão” em nossas vidas, os nossos momentos de “claustrofobia dentro de uma relação”.
(Texto recentemente publicado, em nova edição, pela Editora Cosacnaif, São Paulo, 2011)